terça-feira, 5 de janeiro de 2016

O momento das modelos negras na moda mundial

Binx Walton, Ysaunny Brito e Kayla Scott na campanha da Balmain Outono/Inverno 2014 ©Mario Sorrenti/Reprodução
Fala-se muito de diversidade na moda e temos notado um aumento na presença de modelos negras em capas de revistas, editoriais, campanhas e desfiles. Para se ter uma ideia, o site theFashionSpot analisou 577 campanhas publicitárias de Primavera 2015 e chegou aos seguintes números: dos 811 modelos, 84,7% eram caucasianos, 5,7% asiáticos, 5,1% negros e 2,3% latinos. Ainda há bastante espaço para melhoria, mas, vendo os dados – mesmo parecendo que não – nota-se que o mercado está, aos poucos, avançando. Se esta mesma pesquisa fosse feita há 10 anos, o número seria diferente.
Os bookers das principais agências festejam as melhorias do mercado. Para Anderson Baumgartner, da Way Model, estava mais do que na hora de a indústria abrir os olhos. “Não só o mercado está enxergando diferente, mas o próprio consumidor abriu os olhos pra essas deusas lindas. Hoje, ver uma modelo negra nas capas das revistas e em campanhas de grandes marcas internacionais mostra que a beleza negra vende, sim! Demorou pra acontecer, na minha opinião, mas graças a Deus chegamos lá. Eu trabalho com modelos há 17 anos e sempre defendi mulheres lindas, independente da cor da pele. Se a menina tiver beleza, altura, corpo e personalidade, ela vai entrar na Way sendo da pele branca, vermelha ou negra”, comenta ele. Já Laura Vieira, da Mega Partners, acha gratificante participar deste momento transformador: “Atualmente, a padronização não está mais em destaque e o mercado tem procurado modelos de diferentes perfis. Acredito que discussões sobre temas como o racismo e a diversidade, bastante abordados de um tempo pra cá, tenham contribuído”.
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Emanuela de Paula na capa da “FFWMAG” 38, fotografada por Rogério Mesquita ©Reprodução
É interessante ler chamadas do tipo “primeira modelo negra da capa de tal revista” ou “modelo negra abriu desfile de grife em Paris”, exemplos de coisas que não deveriam causar surpresa, mas causam por não serem fatos cotidianos. Felizmente, mais e mais marcas, como Burberry e Balmain, ou, no Brasil, Alexandre Herchcovitch e Farm, para citar apenas alguns nomes, estão abrindo espaço para estas modelos. Estilistas como Jean-Paul Gaultier sempre trabalharam com diversidade. Leonardo Gomes, agente internacional que convive diariamente com grandes clientes de Milão, acha que a verdadeira beleza não tem cor. “O importante é representar o produto ou a proposta da coleção naquele momento”.
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Naomi Campbell e Jourdan Dunn na campanha da Burberry Primavera/Verão 2015 ©Mario Testino/Reprodução
Recentemente, a gigante do underwear Victoria’s Secret divulgou uma lista de 10 novas Angels na qual aparecem a americana Jasmine Tookes e a brasileira Laís Ribeiro – ambas negras, uma novidade que não existia na lista antiga. Aliás, Laís, que pelo censo brasileiro é considerada parda, lá fora, no mercado de moda, é apresentada como negra. “Eu tenho muito orgulho da minha cor e fico feliz em acompanhar um momento em que o mercado dá espaço à beleza morena e negra. No Brasil me consideram morena. No mercado internacional me consideram negra. Independentemente de como me classificam, acho justa e necessária a diversidade na moda. É preciso dar espaço a todas as raças”, diz ela.
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Laís Ribeiro na capa da “Elle” Itália ©Hans Feurer/Reprodução
Para João Henrique Almeida, diretor internacional da Joy Model Management e agente de Laís, a moda se adapta ao comportamento da sociedade. O que ocorre na moda não é diferente de outras áreas: ainda há poucos políticos negros, poucos executivos negros em cargos de diretoria e poucos negros até mesmo na publicidade tradicional. “Na atualidade, o discurso por inclusão e diversidade é muito forte, e nada mais natural e urgente do que a moda abraçar esta causa e abrir espaço para que todos os biótipos possam trabalhar, e para que o público tenha diferentes referenciais. Não somente as negras têm conquistado seu merecido espaço. As orientais, as trans, as plus size – cada uma tem conseguido seu espaço e seu público. Além de Laís Ribeiro, outras brasileiras também têm se destacado: Mariana Santana, Simone Carvalho e Marina Nery são nomes que efetivamente trabalham hoje no mercado internacional e nacional, indo na contramão da dominação loira/europeia para qual a moda se rendia em tempos anteriores. A democracia e a aceitação da diversidade são assuntos importantes e em alta.”
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Mariane Calazan para Herchcovitch;Alexandre S/S 2015 ©Miro/Reprodução
Pensando no crescimento do setor, o agente Helder Dias criou a agência HDA Models, que é focada em agenciar modelos negras para o mercado publicitário. Para ele, o Brasil tem ainda muito a melhorar e aprender com os exemplos lá de fora. “Recentemente li em um conceituado site de moda uma matéria sobre ‘as nove modelos negras que se destacaram no SPFW’, mas acho esse número pequeno se comparado ao contingente de modelos brancos contratados, lembrando que boa parte dos modelos negros que apreciamos nas passarelas representa uma minoria. Na última temporada, seis das nossas modelos fashion foram apresentadas e só duas conseguiram fazer os testes, sendo só uma selecionada para a prova de roupas, e ela acabou não desfilando, pois segundo o produtor ‘ela não era o perfil’. Ora, uma modelo com altura de 1,80, manequim 36, quadril 88, cintura 60 e que desfila muito bem não é o perfil? Qual é o perfil? Acredito que a responsabilidade não seja da organização do evento e nem das marcas, pois o filtro sempre é realizado pelos produtores. Por fim, a própria palavra inclusão já revela que há a exclusão.”
Vale lembrar que em eventos como o SPFW, cabe à marca e sua equipe a escolha das modelos. A Luminosidade, empresa que organiza a semana de moda, recomenda o uso de pelo menos 10% de modelos negras nos desfiles. A revista “FFWMAG”, da Luminosidade, tem presença constante de negros em sua capa.
Mesmo que os números são sejam iguais, é notável que modelos negros têm conquistado cada vez mais espaço na moda e a tendência é que ele aumente, não só para esse grupo, como para outros exemplos de diversidade.

 

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